O vento tinha soprado

Jorge dormia mal há meses. O filho lá fora e a guerra lá dentro traziam-lhe muito pouca paz. A vida estava feita. O vento tinha soprado. E a morte só lhe teria a colher dignidade e, dava muitas graças, todas aquelas manhãs em que passava a ferro.
Figueira dos desígnios

O novo ciclo autárquico impõe também um relançamento do eterno debate em torno do “desígnio” da Figueira da Foz, da sua “imagem de marca”, do seu destino. Que futuro? Que estratégia? Que identidade? Aquelas questões que não podem deixar de ser cíclicas porque esse também é um sintoma da vitalidade e do inconformismo de uma comunidade. A Figueira da Foz assiste aos sinais dos tempos e debate-se, questiona-se e atualiza-se. É uma boa conversa.
Na floresta gelada à porta da Europa

A Europa louva-se da sua carta dos direitos do homem e do cidadão, da criança, louva-se dos seus valores, princípios, e cada vez que há um ataque terrorista são o nosso modo de vida, os princípios e valores humanistas europeus que aparecem nas bandeiras discursivas a afirmar que não nos vergaremos, não nos demoverão de continuarmos a ser os moralistas do mundo.
Segunda Vaga

Três dias antes o Zepelim havia acostado ao céu da cidade. Era a segunda vaga. A primeira tinha acelerado o fim da pobre Geni. A sua irmã ainda não tinha perdoado a cidade, jamais perdoaria.
Sinos

Entre 18 de Outubro e 28 de Novembro de 1996, na Figueira da Foz, decorreu o ciclo de colóquios “Alberto Pessoa”.
Com mérito, tal acontecimento foi levado a cabo pela Assembleia Figueirense e assim designado para homenagear Alberto Pessoa, o Arquitecto que, ipsis verbis, “decerto, mais viu e sentiu a Figueira da Foz”.
Michel Houellebecq – “Intervenções”

MH é dos casos em que o fascínio da obra levou a um certo culto do homem. E é isso, julgo eu, que justifica esta edição. Pessoalmente, prefiro, de longe, o romancista ao analista social, ao filósofo, o que seja. A leitura de “Serotonina”, “A possibilidade de uma ilha” ou “Plataforma” é bem mais estimulante do que estas “intervenções”.
Do mar-chão ao mar-festivo (5)

Os intelectuais, que são conotados sempre com atitudes futuristas, não têm lugar na Figueira da Foz. Não existem poetas, escritores, articulistas de têmpera e verve, músicos ou actores de craveira; a intelectualidade figueirense exilou-se e buscou outras paragens porque, na verdade, não existe ambiente intelectual. A última realização cultural de porte que aqui se fez importava os seus protagonistas e nunca conseguiu seduzir verdadeiramente o figueirense, mesmo aqueles que tinham pretensos interesses intelectuais
Do mar-chão ao mar-festivo (4)

A partir de uma dada altura a praia vai-se perdendo; metaforicamente, mas não só, o mar afasta-se. A construção do molhe norte, tão desejada pelos figueirenses, aniquila o mar como recurso estival. Em seu lugar instala-se um areal distante que confere luz própria à urbe, mas que põe o mar longe. Este areal, liso, branco e vazio, é a imagem da alma figueirense, despovoada dos encantos marinhos e do que lhe estava tão proximamente associado.
Do mar-chão ao mar-festivo (3)

A cidade monta um cenário para um espectáculo que decorre durante um certo período e, no final, desmonta-o. O palco esvazia-se, o público debanda, ficam os restos da festa.
Do mar-chão ao mar-festivo (2)

A Figueira da Foz é sinónimo de praia. Ainda hoje. Não porque seja uma referência dos nossos dias como estância balnear, mas porque a praia foi a melhor e a mais forte das suas imagens de marca. Não interessa aduzir aqui das razões que levaram à decadência da Figueira e Buarcos como destino de férias de Verão, mas atentar na importância que teve o nascimento e o apogeu da praia na conformação do carácter das gentes.